Bismillah-ir-Rahaman-ir-Rahim
As-Salam-Alai-Kum, Que a paz esteja convosco
Sua Excelência Mintimer Shaimiev,
Sua Excelência Eleonora Mitrofanova,
Respeitados Membros do Governo,
Ilustres Convidados
É um enorme prazer dar-vos a todos as boas-vindas a esta cerimónia.
Estamos aqui hoje reunidos com um grupo de pessoas extraordinárias, num local extraordinário e com um propósito extraordinário.
O Prémio Aga Khan para a Arquitetura organiza-se em ciclos de três anos - cada um culminando no reconhecimento dos nossos vencedores.
Hoje celebramos os resultados do nosso Décimo Quarto Ciclo.
Este é um momento extraordinário para mim, ao recordar a nossa decisão de lançar este programa - há mais de quatro décadas.
O que levou a essa decisão? - Vocês podem perguntar - como muitos já o fizeram, na altura e ao longo dos anos. Porque haveria o Imamat Ismaili de se envolver tão profundamente no mundo da arquitetura profissional?
A resposta simples reside na minha convicção de que a Arquitetura - mais do que qualquer outra forma de arte - tem um profundo impacto na qualidade da vida humana. Como já foi dito, nós moldamos o nosso ambiente construído - e depois somos moldados pelos nossos edifícios.
Essa estreita relação entre a arquitetura e a qualidade da experiência humana tem uma ressonância particularmente profunda no mundo em desenvolvimento. Acredito que todos temos a responsabilidade de melhorar a qualidade de vida quando e onde a oportunidade surja. O nosso compromisso de influenciar a qualidade da arquitetura - intelectualmente e materialmente - decorre diretamente do nosso compromisso em melhorar a qualidade da vida humana.
Como deverão saber, ao longo destas quatro décadas, temos distinguido uma vasta gama de contribuições arquitetónicas, incluindo mais de nove mil projetos nomeados.
Mas o valor deste programa vai muito além do reconhecimento de projetos específicos.
O Prémio Aga Khan para a Arquitetura não é simplesmente um prémio; é um processo.
Este processo envolve uma grande variedade de conversas - em todo o mundo - que determinam o processo de seleção.
O tema do Ciclo, que culmina na cerimónia de hoje, é: “Arquitetura em Diálogo”. Este tema, que surgiu das deliberações do Comité Diretivo e do Grande Júri, vê a arquitetura como um robusto intercâmbio que pode abraçar uma variedade de perspetivas diversas e até divergentes.
Um verdadeiro diálogo exige não só que defendamos uma perspetiva, mas também que escutemos - com atenção - as outras perspetivas. Mais do que isso, o diálogo pede-nos não apenas para nos ouvirmos uns aos outros, mas também para aprendermos uns com os outros.
Existem várias formas através das quais a arquitetura pode combinar diferentes perspetivas. Deixem que descreva apenas quatro delas,
Antes de mais, devemos promover um diálogo saudável entre os participantes efetivos no processo arquitetónico. Não estou a falar apenas de arquitetos competentes, mas também aqueles que com eles colaboram - clientes, líderes comunitários, funcionários públicos, educadores, e os construtores, designers e artesãos que ajudam a concretizar os seus planos. O nosso Grande Júri para este ciclo prestou muita atenção a esta dimensão, avaliando qualidades como liderança, cooperação e abertura - qualidades que ajudam a produzir um diálogo criativo.
Um segundo diálogo que promove o melhor da arquitetura humana é um diálogo aberto entre o passado e o futuro. Isto significa mais do que apenas copiar o passado - ou simplesmente colocar um arco, um minarete ou uma caligrafia antiga num edifício novo. Por outro lado, também significa mais do que uma abordagem modernista negligente que ignore o nosso rico património. Percebemos, há mais de 40 anos, que a prática arquitetónica nas sociedades muçulmanas se tinha recentemente esquecido da sua própria história, algo que nos ajudou a delinear a natureza deste prémio.
O diálogo que buscamos é aquele que irá combinar a inspiração do passado com as exigências do futuro. As exigências são muitas: ambientais, sociais, tecnológicas e económicas, sem mencionar os desafios da polarização política. Perante todas estas dimensões, olhar para trás pode ajudar-nos a olhar para o futuro - e vice-versa.
Um terceiro diálogo que chama a atenção na arquitetura é o diálogo entre a natureza, por um lado, e a criatividade humana, por outro. Tanto o mundo natural como o mundo das capacidades humanas são dons divinos, mas por vezes é tentador abraçar um sem pensar muito no outro.
O Alcorão Sagrado pede aos muçulmanos que não sejam beneficiários passivos do nosso Habitat Natural, mas que sejam fiéis guardiães da criação divina; precisamos de expandir o nosso compromisso em todas as direções. Isto significa não nos conformarmos apenas ao poder da natureza, mas envolvermo-nos ativamente nos seus desafios. Ao mesmo tempo, devemos ter cuidado para não exagerar as capacidades de domínio humano - tentar desafiar a natureza é contraproducente a vários níveis. Um diálogo reflexivo entre as realidades naturais e as capacidades humanas também é algo que está na essência da excelência arquitetónica.
Por fim, no quarto ponto, gostaria de destacar a importância do diálogo intercultural na resposta às oportunidades arquitetónicas do nosso tempo. Já referi que este Prémio surgiu de uma preocupação com a deterioração - aquilo a que alguns de nós chamámos a "hibernação" - das ricas tradições arquitetónicas muçulmanas. Mas honrar a própria identidade histórica não tem de implicar alguma espécie de isolamento restritivo.
O rico diálogo arquitetónico que procuramos promover deve incluir um respeito renovado pela rica diversidade das próprias culturas islâmicas. Como forma de exemplificar esta preocupação, abrimos recentemente um novo Centro Aga Khan em Londres, onde foram incorporados sete jardins islâmicos refletem sete tradições muçulmanas.
Para além disso, também devemos trabalhar para promover um diálogo enriquecedor com as culturas não-islâmicas - incluindo as diversas tradições religiosas. A arquitetura pode liderar este esforço - à medida que nos escutamos uns aos outros e aprendemos uns com os outros, esbatendo velhas divisões.
O pluralismo significa mais do que simplesmente tolerar uma diversidade de influências e ideias. Também significa acolher as oportunidades de aprendizagem que a diversidade oferece, descobrir formas de honrar aquilo que é único nas nossas tradições individuais e os valores que nos ligam a toda a humanidade.
Temos de pensar na diversidade como um dom divino, uma bênção e não um fardo.
Referi anteriormente que hoje estamos reunidos num local especial. O Tartaristão é, há séculos, um local com um compromisso excecional para com os valores pluralistas. A cidade de Kazan e a sua região são conhecidas pela sua rica mistura de etnias e culturas, incluindo o modo impressionante como o seu património arquitetónico tem sido preservado e respeitado.
É impressionante perceber que a cidade vizinha de Bolgar, que visitei ontem, se tornou um centro religioso muçulmano em 922 - há quase mil e cem anos. Ao longo dos séculos, o espírito do pluralismo no Tartaristão passou por períodos de desafios difíceis e por períodos de uma renovação inspiradora. Mas, apesar de tudo, persiste o compromisso para com a inclusão. Este espírito foi incentivado pela liderança pluralista de vários Canatos Muçulmanos que governaram esta área nos séculos XIV e XV, e também por alguns governantes russos posteriores, como Pedro, o Grande, e Catarina, a Grande. E este espírito tem estado bastante presente neste local nos últimos anos.
Durante as minhas visitas a Kazan e Bolgar, vi a forma como pessoas empenhadas podem honrar o poder da identidade cultural e do pluralismo cultural. É impressionante ver como igrejas e mesquitas, por exemplo, foram construídas e preservadas perto umas das outras enquanto símbolos poderosos de um profundo diálogo intercultural.
Espero que todos possamos ajudar o resto do mundo a seguir o poderoso modelo pluralista de lugares como Kazan e Bolgar.
O mundo precisa de exemplos destes. Os desafios humanos parecem intensificar-se a um ritmo acelerado nos dias de hoje - alterações climáticas, desigualdades económicas e tecnológicas, epidemias, polarização política, deslocamentos populacionais e a difícil tarefa de nos ajudarmos uns aos outros a viver juntos em dignidade.
Acredito profundamente no potencial do mundo da arquitetura para ajudar a inspirar e enriquecer um diálogo criativo em todas as quatro áreas que mencionei: um diálogo entre parceiros criativos de arquitetura, um diálogo entre passado e futuro, um diálogo entre a realidade natural e a criatividade humana e um diálogo entre diversas culturas.
Quando inicialmente antevi esta visita ao Tartaristão, os meus pensamentos recuaram até outras cerimónias do Prémio ao longo destas quatro décadas. As primeiras cerimónias foram realizadas em Lahore, no Paquistão, e lembro-me de expressar a minha esperança, naquela noite, de que estes Prémios não fossem vistos como o fim de uma história, mas antes como um começo ambicioso - estimulando novas discussões, ideias, questões, debates e “talvez ainda mais, algumas preocupações ”- como eu disse na altura - acerca do nosso futuro arquitetónico. E hoje devo dizer que estou satisfeito porque as expectativas que expressei em Lahore há quatro décadas foram todas cumpridas.
O facto de o tema deste ciclo estar construído à volta da palavra "Diálogo" é prova das nossas constantes ambições. Agradeço a todos por fazerem parte desta extraordinária celebração - na qual refletimos, com gratidão, acerca das dádivas inspiradoras do passado e das ricas possibilidades do futuro.